Trabalho feito para nota do Módulo de Movimentos Sociais da América Latina - PUC/SP
Este trabalho mostra um pouco sobre a trajetória do movimento cocalero na Bolívia e a ascenção do atual Presidente Evo Morales. Muito bacana este texto!!!!!!!
Vivian Urquidi é doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo, em seu livro “o Movimento Cocalero na Bolívia, refaz uma trajetória política dos camponeses cocaleros da Bolívia, um movimento social que nas ultimas décadas, segundo a própria, é complicado de ser compreendido e abordado do ponto de vista histórico e também dos movimentos sociais que lutam pelo interesse da classe e constitui níveis de consciência e autoconhecimento político.
Vivian começa seu trabalho dizendo que o movimento cocalero deixa de longe ser um movimento isolado, mas que este acompanhou a emergência de outros setores ativos da sociedade, o que implicou em questões étnicas com reivindicações sociais e econômicas e que a folha de coca esta inserida em uma questão cultural dos povos andinos.
Segundo a autora, indiferente de ser na serra colombiana, equatorianas ou nos Andes, o movimento dos camponeses está inserido em um desenvolvimento extremamente limitado das suas forças produtivas (Urquidi, 2007).
O movimento cocalero, foi formado por camponeses quíchuas, que se deslocaram para Cochabamba a fim de encontrar uma alternativa de sobrevivência. O fim das utopias libertarias que por conseqüência resultou na nova política boliviana, fez crescer o desemprego, a recessão econômica e o setor mais organizado do país, o proletariado mineiro.
É importante lembrar que, toda esta crise se deu através das reformas políticas, abertura das fronteiras para importações e o congelamento dos salários das instituições publicas e também do enxugamento do governo. Tudo isso coincidiu com o termino da Guerra Fria e com as estruturações dos blocos de influencias, o que resultou em um modelo neoliberal.
A partir destes percalços, surgem os cocaleros como forma da nova fase de exclusões sociais. Foi nos interstícios desta crise política que emergiram, na América Latina toda, forças latentes da sociedade organizadas em Novos Movimentos Sociais (NMS) (Urquidi, 2007).
A falta de identidade e uma filiação política definida, fez com que estes novos movimentos na America latina tomassem impulsos diversos, dentre eles, os culturais e étnicos, organizados por meios de identidades especificas ou até mesmo locais.
O grau de auto-reflexão e o nível do pragmatismo dos cocaleros fazem pensar que este movimento é também conseqüência das suas histórias de luta, num país marcado pela pobreza e desigualdade, pela vulnerabilidade econômica frente à agressividade dos mercados externos, e pela tradicional tendência à exclusão social dos indígenas por parte das elites. [...] (Urquidi, 2007).
A Bolívia tem sido o país mais pobre da América Latina perdendo apenas para o Haiti, com uma renda per capita de US$ 933, alem de ter sua economia basicamente na extração de mineral, petróleo e agricultura. O país ainda conta com uma base industrial precária e uma indústria manufatureira iniciante, a modernização revolucionaria deu ênfase a exploração de terras como única e verdadeira fonte de riqueza.
O camponês boliviano buscou alternativas para sua sobrevivência, hora mudando de cidade, hora mudando de país, mas o setor de produção artesanal optou pela migração para a região do Chapare, sendo que esta região se destaca pelo cultivo da folha de coca para uso do narcotráfico.
O cultivo da folha de coca na região do Chapare foi incentivado desde o inicio da década de 1980, a região que até então tinha uma população de 25 mil habitantes em 1970, passou a ter 140 mil, com o cultivo da folha a região tem um salto de mais de 20% na população.
O colonizador típico do Chapare é um migrante recente – dos últimos vinte anos – que em geral chegou espontaneamente à região, procedendo principalmente de Cochabamba e tendo como característica básica o fato de ser descendente do horizonte quíchua. Sem nunca ter perdido contato com suas regiões e origem – com as quais mantém relações continua –, na maioria dos casos, o cocalero ou não possui terras noutros sítios, ou elas estão localizadas nas comunidades de origem, em zonas áridas, ou, desde a reforma agrária, elas foram se constituindo em minifúndios não superiores a um hectare. Pelo seu passado rural, o cocalero padrão não aceita perder o estatuto de produtor independente nem vender sua força de trabalho em troca de um salário (Urquidi, 2007).
Apoiando-se na reprodução familiar, o cocalero usufrui da troca de serviços com as pessoas alheias para os períodos de cultivo ou colheita da folha de coca. Mas o que predomina realmente é o fato do cultivo da coca ser predominante no seu sistema produtivo, principalmente na década de 1970, quando o mercado de cocaína atingiu sua máxima.
O produtor é capaz de conseguir uma autonomia superior à de qualquer outro camponês e ainda preserva sua relação direta com a terra e um fluxo de renda que não consegue jamais em qualquer outro meio rural. Devemos lembrar que, nem por isso o produtor de coca supera os índices de pobreza, característicos das zonas rurais.
A posição que os cocaleros ocupam na cadeia produtiva do narcotráfico, reserva a menor parte do lucro gerado pelos negócios. Sendo assim, percebemos que aos produtores da folha de coca somente rende o suficiente para que saia do status de pobreza, mas o camponês boliviano não supera o quadro de pobreza rural. Segundo estudos do programa das Nações Unidas Para o Desenvolvimento (PNUD), realizados em 1995, devido o cocalero ter uma economia diretamente com a produção da folha de coca.
Não existem dados concretos do governo, mas estimativas dizem que o mercado de folha coca até o final da década de 1990, 10% da produção seria utilizada de forma tradicional, enquanto os outros 90% constituiriam a produção excedente destinada à fabricação da cocaína. Devido este motivo, o plano Coca Zero, conveniado com a Embaixada dos Estados Unidos, o governo boliviano se comprometeu até o inicio de 2000, extinguir totalmente a produção da folha, mesmo sem acordo dos cocaleros.
Mesmo não atingindo suas metas o projeto Coca Zero, acabou rendendo fluxos de capitais ao governo como forma de apoio econômico externo.
De acordo com (Urquidi, 2007), os primeiros passos do Movimento Cocalero surgiram com vista a combater este programa de erradicação da folha de coca. Os cocaleros defendiam o cultivo da folha não só pelo valor econômico, mas principalmente por seu mérito cultural e identitário. Esta grande organização dos cultivadores de coca foi dando origem ao Movimento al Socialismo (MAS), dirigido pelo índio aymara Evo Morales. Morales entrou em 1978 no exercito de Padilla, mas afirma que, sua participação no exército e do modo como compreendeu o funcionamento do governo, basicamente repressora, descobriu as injustiças que se cometiam contra os despossuídos. As reivindicações do movimento não se limitaram apenas à luta pela folha de coca, mas também pela revalorização da população indígena que por muito tempo foi excluída socialmente.
Em 1997 o movimento cocalero liderado pelo líder Evo Morales, conquistara algumas cadeiras no parlamento boliviano, o que despertou uma mobilização por parte de Hugo Bánzer, líder do governo anticocalero. Bánzer vai propor em sua gestão a erradicação total da folha de coca destinada ao narcotráfico.
Mas, entretanto os 15 anos de mobilização cocalera prevalecem e contraposição dos desmontes das organizações populares existente em meados de 1980, acaba dando um temperamento nas mobilizações sociais que estão surgindo ao final do milênio. Morales passa a ser o centro das atenções das massas bolivianas, pois se mostra um líder totalmente antiliberal.
O governo do presidente Sanches Losada, acabou levando a população a viver em condições desumanas. As políticas de privatizações se instalaram na Bolívia, por conta disso alguns movimentos liderados por associações de bairro sindicatos dos camponeses entre outros, saíram às ruas da cidade para protestar contra as políticas que pretendiam privatizar os recursos hídricos do país.
A chamada “Guerra Del Agua” como ficou conhecida, acarretou em uma onda de mobilizações populares integrado por diversos movimentos civis, acabou atingindo seu objetivo graças à pressão da massa camponesa liderada pelo movimento cocalero.
Em 2002 nas eleições para presidente, o partido de Morales, o Movimento Al Socialismo (MAS), atingiu o segundo lugar com 20,94% dos votos contra 22,45% do MNR. Pela primeira vez uma massa importante da população votaria para presidente por um indígena, sem titulo acadêmico, mas avaliado por sua luta a favor da soberania nacional.
Com tudo isso, a projeção política do partido esta ameaçada pelas contradições internas que o movimento deverá resolver. A principal é a aproximação dos plantadores da folha com o trafico de cocaína, que cada vez mais acaba aliciando novos membros.
Bibliografia
Urquidi, Vivian F. D. O Movimento Cocaleiro na Bolivia. São Paulo. 2007: Hucitec.